Sujet Portugais LV1 IENA 2011

O RENDIMENTO DESCE, A OBESIDADE CRESCE

Em 1997, a Organização Mundial da Saúde (OMS) considerou a obesidade uma epidemia global e intitulou-a como a « New World Syndrome », numa designação que tem propositadamente dois sentidos: « A Nova Síndrome Mundial » ou « a Síndrome do Novo Mundo » (uma forma de designar a América do Norte). De facto, é o padrão alimentar e social dos Estados Unidos que passou a expandir-se através da globalização.

O mercado global tornou insustentável a agricultura e a agro-indústria locais, incapazes de competir com os produtos industrializados oriundos das grandes companhias dos países mais desenvolvidos. Os produtos tradicionais têm muita dificuldade em sobreviver. A concentração urbana forçada leva a aglomerados onde os espaços livres são escassos e o tempo nos transportes consome uma parte do dia que eventualmente poderia ser dedicada ao lazer, com práticas de vida ao ar livre, jogos, brincadeiras e desporto. As mulheres integraram o mercado do trabalho, o que é com certeza uma boa forma de estar no espaço público, mas com as horas de transporte ficam sobrecarregadas pela tradicional repartição do trabalho doméstico e noã têm energia, motivação nem tempo para a produção da alimentação caseira. A comida processada, rápida, mas saciante, logo com gorduras e açúcares, é o recurso habitual.

A concentração do poder num pequeno número de poderosas companhias da indústria alimentar bloqueia as decisoões políticas dos governos e, no nosso caso, do Conselho Europeu. Os planos alimentares nacionais não existem e a agricultura e pescas são condicionadas por Bruxelas.
De acordo com as proprias apreciações sa OMS, as modas alimentares são condicionadas pelo mercado global e também pela informação global, como acontece com a imitação automática e inconsciente das práticas observadas nas personagens das séries televisivas. E a própria postura física sedentária é veiculada pelos meios de informação. É aquilo que os investigadores consideram o mimetismo na espécie humana.
Esta concorrência de factores explica que em todos os países desenvolvidos na era pós-industrial a obesidade tenha um relação inversa com o rendimento. Nestes países, os mais pobres são os mais obesos. É também o que se passa em Portugal. […]

Com o aprofundamento da crise em Portugal podem colocar-se hipóteses. Num primeiro tempo a obesidade vai aumentar, com maior incidência nos mais pobres. As mulheres desempregadas apresentarão mais obesidade, como se tem verificado em outros países, embora o mesmo não se verifique com os homens desempregados. Está demonstrado que os horários de trabalho desregulados e a privação de sono aumentan o apetite, o que também concorrerá para a obesidade.
A indústria agro-alimentar de fast-food será mais agressiva e apetecível. Os defensores da abolição da publicidade a alimentos nos programas infanto-juvenis da televisão perderão terreno, numa altura em que a « economia » deve ser « ajudada » (levar as crianças a ingerir mais produtos dos que são publicitados, 90% dos quais são hipercalóricos).
Neste momento, Portugal, Espanha, Grécia e Itália têm as maiores prevalências de pré-obesidade e obesidade infanto-juvenil da Europa. Um terço das crianças e jovens têm peso excessivo. É provável que mantenham esse lugar, a par do tão falado défice. Estas crianças, daqui a cinquenta ou sessenta anos, terão uma esperança de vida menor do que a nossa; é o que calculam os epidemiologistas. Já não estaremos cá para o comprovar. Mas estarão elas, para olharem para trás e para nos responsabilizarem.

Num segundo tempo, iremos ter fome de « apertar o cinto »? É difícil prever, neste momento, se chegaremos ao ponto de haver défice calórico. Há com certeza défice em ferro, em proteínas, em càlcio e em vitaminas antioxidantes. Por enquanto, os municípios estáo a dar refeições no ensino básico, o Ministério da Educação ou as autarquías distribuem algumas refeições e fruta, o Banco Alimentar, as Misericórdias e outras instituições de solidariedade fornecem centenas de milhares de refeições. A rede do Estado e dos privados parece ser suficiente sob o ponto de vista calórico. Mas a qualidade geral vai ser afectada, enquanto a obesidade vai aumentar. Poderemos, por exemplo, ter meninos « gordos », mas menos altos por falta de proteína.

E, no entanto, outro caminho seria possível. Num país rodeado de mar e com a maior tradição de alimentação com peixe da Europa, produtor de fruta e lacticínios de grande qualidade, seria possível um plano alimentar nacional para enfrentar a crise, para enfrentar a obesidade e para enfrentar Bruxelas. Será possível?

Isabel do Carmo, in Le Monde diplomatique, Agosto de 2010

I – VERSION (sur 20 points)

Traduire depuis « O mercado global tornou … » jusqu’à « …do Conselho Europeu. ».

II – QUESTIONS (sur 40 points)

1 – Question de compréhension de texte :
Porque é que « A comida processada, rápida, mas saciante, logo com gorduras e açùcares, é o recurso habitual. » ?
(100 mots + ou – 10%* ; sur 10 points)

2 – Question de compréhension de texte :
Qual vai ser a evolução da obesidade com o aprofundamento da crise ?
( 100 mots + ou – 10%* ; sur 10 points)

3 – Question d’expression personnelle :
« E no entanto, outro caminho seria possível. Num país rodeado de mar e com a maior
tradição de alimentação com peixe da Europa, produtor de fruta e de lacticínios de grande
qualidade, seria possível um plano alimentar nacional para enfrentar a crise, para enfrentar a
obesidade e para enfrentar Bruxelas. ». Diga o que pensa dessa afirmação de Isabel do Carmo.
(300 mots + ou – 10%* ; sur 20 points)

* Le non-respect de ces normes sera sanctionné
(Indiquer le nombre de mots sur la copie après chaque question)

III – THÈME ( sur 20 points)

Bruno Cabrai, 29 ans, est un recibo verde. « Dans ma génération, on ne connaît que cette forme de salariat. C’est le symbole de la loi de la jungle, un laboratoire social grandeur nature où s’expérimente une totale dérégularisation du marché du travail. » Le reçu vert ? Un simple talon de coupons détachables avec lesquels les employeurs remunèrent un travail. Ce système maintient toutes les obligations pour le salarié…Mais lui ôte tous les avantages. Alors finis les congés payés, les treizièmes mois, le congé maternité… Bref, un emploi stable. Le patron est client. Et le travailleur, un simple prestataire de service, contraint de facturer son travail. A tout moment cette fragile « relation » peut être rompue. Et bien sûr sans la moindre indemnité chômage. « Le plus scandaleux, ajoute Bruno Cabrai, c’est que nous devons en plus payer une cotisation à la sécurité sociale, de 170 euros au minimum. Comment faire avec des salaires de 500-600 euros ? C’est simple, la plupart n’ont pas de sécu…. »

François Musseau in Libération, 4 Mars 2010