Sujet Portugais LV1 CCIP 2011 (Expression écrite)

EXPRESSION ECRITE

« Ruínas, um filme de Manuel Mozos » – Entrevista.

O cineasta Manuel Mozos filmou edifícios em decadência e ofereceu-lhes histórias. Nesse cruzamento de imagens e de textos fala-se, em « Ruínas », de um país mais de misérias do que de grandezas. Isto é Portugal. « De grandes esperaças mas, ao mesmo tempo, de uma certa mesquinhez, uma coisa de remediado ». Belíssimo.
Há quanto tempo ninguém andava por aqui? Quem se lembra ainda do que aqui se passou?

Manuel Mozos tem por hábito ir anotando num caderno coisas destas: lugares, uma notícia que leu numa revista, uma referência de um texto. O que queria fazer em « Ruínas » – o filme, uma produção de O Som e a Fùria, que estreou esta semana – era cruzar essas coisas. Queria filmar os espaços vazios, sim, mas queria povoá-los, dar-lhes vozes, sons, fazê-los habitar por fantasmas que, se calhar, não eram os fantasmas desses espaços – eram outros, que obrigaram os primeiros a chegar-se para o lado e a deixá-los instalar-se também.

« Ruínas » é uma sucessão de imagens de espaços que o país deixou para trás, que esqueceu, mas que não desapareceram. Muitos permanecem, de pé, numa dignidade silenciosa, abandonados mas não vencidos. Ninguém passa por eles, mas eles ainda ali estão.

« O que me interessa, quer nos espaços quer nos outros materiais que utilizo no filme, é serem coisas que acho interessantes e que se diluem, se perdem. Achava importante dar-lhes alguma vida, tentar que não desaparecessem completamente », diz o realizador. Não se trata de um olhar nostálgico ou saudosista, sublinha. « Mas são sitios que têm um lado poético, de coisas que existiram, que fizeram parte de histórias deste país. »
Inicialmente pensou usar cxcertos de filmes antigos, postais, ou até encontrar pessoas que pudessem contar histórias sobre aqueles sitios. Pensou, inclusivamente, em alargar o filme a outras coisas que estavam a desaparecer, « profissões, jardins, matas, falar da transformação de certas coisas, da construção de campos de golfe ou do efeito das auto-estradas nos percursos dos animais », não numa perspectiva sociológica mas apenas como uma constatação de que é assim. Mas à medida que ia filmando foi abandonando essa ideia. O filme foi-se tornando cada vez mais depurado até chegar ao essencial: espaços vazios e sons.

E o que faz a força de « Ruínas » é esse cruzamento, sempre ligeiramente deslocado. entre o que os nossos olhos vêem e a história que estamos a ouvir. No Restaurante Panorâmico de Monsanto, enquanto a câmara mostra uma escadaria, a janela panorâmica, os murais, uma voz lê uma ementa [[menu]] de um livro de receitas do século XVI – uma lista de iguarias [[mets]] que, para Mozos, « se conjugava com aquela monumentalidade ».

Ás vezes, como no caso do sanatório das Penhas da Saúde, o que ouvimos – neste caso: relatórios médicos com todos os pormenores sobre o estado de saúde dos doentes à entrada e à saída do internamento – tem a ver com a história do sítio. Outras vezes é apenas uma história que podia pertencer àquele lugar, e só por acaso não pertenceu […]. Os « makavenkos » [Memorias e Receitas Culinárias dos Makavenkos, de Francisco de Almeida Grandella, 1919], por exemplo, aparecem mais do que uma vez, sem qualquer ligação aparente com o que estamos a ver. Mas este clube de « bons vivants », formado para os prazeres da comida, fundado em 1884 por Grandella e alguns amigos, apareceu naturalmente no processo de pesquisa de Mozos.

Mas os textos dos « makavenkos » fícaram, entre a história de « Henriqueta, uma heroína do século XIX » e o livro de ciências naturais para a 4.a Classe do Ensino Primário e Elementar do ano de 1961. Com esses textos, os espectadores são conduzidos para a história que o realizador quer contar, seguem atrás dos fantasmas que ele ali quis projectar. […]

O que ficou é também uma história do país. Ou melhor, são histórias de um certo país. Alguns espaços podem ser grandiosos, mas o que ouvimos são histórias pequenas, pequenas misérias. Um país peque,o?
« Pensó que não fugimos a um lado pequenino mesmo quando se tentam coisas mais majestosas ou grandiosas. Em alguns dos textos há uma espécie de impotência, um lado quase tragicómico. Como na primeira historia dos « makavenkos », de um senhor que quer muito escrever uma peça de teatro e nunca consegue, ou o rapazinho que eles adoptam e depois a mãe leva embora. Há um lado, que sinto que é um bocadinho o país, de grandes esperanças mas, ao mesmo tempo, de uma certa mesquinhez, uma coisa de remediado. »

Há, em todo o filme, uma única cena com pessoas. É logo no início, no cemitério do Prado do Repouso, no Porto, no dia de Finados. […]. Se não houvesse pessoas, o filme seria lido de outro modo. Nós, pessoas, temos uma memória. Mesmo quando as coisas desaparecem ficamos ligados a elas. »

É por isso que os espaços vazios estão cheios de vozes.

Alexandra Prado Coelho, « Entrevista. Manuel Mozos nas ruínas das grandes esperanças », Público, 01/04/2010.

Questions (réponses en portugais, 250 mots pour chacune)

1. Neste artigo e entrevista, a jornalista Alexandra Prado Coelho apresenta o filme de Manuel Mozos intitulado « Ruínas ». Que tipo de filme é esse e quai é a temática?

2. «É por isso que os espaços vazios estão cheios de vozes» escreve a autora. Comente esta afirmação.